Anatomicamente o aparelho reprodutor interno e os órgãos sexuais externos da paciente vagínica são normais, porém na tentativa de penetração peniana, ou de qualquer outro instrumento, como por exemplo, o espéculo vaginal usado no exame ginecológico, ocorre o fechamento involuntário do canal vaginal, de forma a tornar quase impossível o coito ou o exame citado, tendo este que ser realizado com uso de anestésico, ou em alguns casos com técnicas tão invasivas que traumatizam fisicamente a área, psiquicamente a paciente tornando seu problema disfuncional ainda mais grave.
Estima-se que muitas mulheres sofrem desse problema, mas devido à vergonha, ou qualquer outra questão que envolva o assunto, como por exemplo, uma rigidez religiosa e/ou cultural que diz que a relação sexual não deve ser uma fonte de prazer, somente deve ter a função reprodutiva, entre outras justificativas que fazem com que muitas não procurem ajuda médica.
Texeira (2009) define o vaginismo como uma contração involuntária dos músculos pélvicos que impede a penetração do pênis, dedo, tampão ou especulo, podendo variar de leve a severa.
Kaplan (ibid) afirma que além desse fechamento involuntário do canal vaginal, algumas pacientes apresentam um quadro fóbico com relação ao coito e a qualquer penetração vaginal, o que resulta em tentativas frustradas e dolorosas, sendo esse quadro uma reação secundária ao vaginismo, podendo ocorrer também o contrario, o vaginismo ter como antecedente um quadro fóbico, veremos as etiologias do vaginismo mais à frente. Segue a autora:
“O vaginismo é devido a um espasmo involuntário dos músculos que circundam a entrada vaginal, especificamente o sphicter vaginae, e dos músculos constritores do ânus, que ocorre sempre que é feita uma tentativa para se introduzir um objeto no orifício vaginal”. (KAPLAN, ibdi, p.391)
Kaplan chama atenção também para os efeitos na unidade conjugal desta disfunção, o dilema vivido pela mulher que quer ser curada, e ao mesmo tempo teme a cura, que inclui ainda o medo que algumas mulheres relatam de perder seus maridos. Masters & Johnson (1970) afirmam que independente da disfunção estar originalmente ligada às atitudes do homem ou da mulher, o problema é mais da unidade conjugal que do indivíduo em questão.
Para Masters & Johnson (1997) o vaginismo caracteriza-se pela observação de espasmos involuntários nos músculos que cercam o canal vaginal. Podendo acometer mulheres nas mais diversas idades, porém, ainda de acordo com os autores é mais comum em jovens que estão iniciando a vida sexual. A forma mais grave em que o vaginismo se apresenta é o impedimento total da entrada da vagina seja por órgão sexual, o especulo ginecológico ou até um dedo.
- Etiologia
Os vários autores que tratam do tema vaginismo apontam para uma etiologia comum, atribuem as disfunções à ortodoxia religiosa, à falta de informação, à inibição, ao histórico de abuso sexual e trauma, entre outros. Leiblum, Pervin & Campbell (ibid) asseguram que:
“Muitos fatores desempenham um papel no desenvolvimento do vaginismo, e de que nenhum padrão etiológico único se destaca como definitivo, Assim, a etiologia do vaginismo continua tendo certa aura de mistério – que, felizmente não precisa ser decifrado para que se possa ajudar a maioria das pacientes com essa disfunção sexual”. (p.262)
Kaplan relaciona o problema a fontes multicausais, acredita que doenças que causem dor na penetração podem evoluir para vaginismo, e nesse caso a melhora do quadro é requisito para o inicio do tratamento propriamente dito. De acordo com a autora:
“É minha impressão que qualquer estímulo adverso que esteja associado à relação sexual ou com a entrada da vagina pode ser responsável pela aquisição dessa resposta, não importando se esta contingência é real ou fantasiosa, nem se é, ou não, do conhecimento consciente da paciente.” (KAPLAN, p.395)
Masters & Johnson entram no tocante de experiências sexuais negativas, traumáticas, abusos sexuais, formação religiosa rígida, atitudes negativas da mãe com relação à formação da filha em uma mulher sexualmente ativa, dando-lhe informações distorcidas carregadas de significados negativos relacionados aos homens e/ou ao intercurso sexual em si, seja pelo aspecto moral, religioso, ou físico, já que algumas caracterizam o coito como fonte de muita dor. Afirmam os teóricos:
“Vale compreender que as mulheres reagem de modos diferentes a seu vaginismo. Algumas conseguem separar o sintoma sexual dos sentimentos de auto-estima; outras tentam enfrentar o problema imediata e diretamente e nunca apresentam o comportamento de rejeição descrito, e outras ainda, com uma forma branda de vaginismo, simplesmente cerram os dentes e se colocam à disposição de seus maridos sem perceberem que sexo sem dor é possível.” (MASTERS & JOHNSON)
Em outra fonte os citados autores relacionam o vaginismo como possível consequência, de questões como subsequente a dispareunia, e até mesmo devido a orientação homossexual, além das causas já relacionadas.
Araujo (2004) destaca a importância do diagnóstico diferencial nos casos de vaginismo, já que a dor na tentativa de penetração, ou dispareunia como é chamada, pode ocorrer em resultado de doença pélvica, Araujo caracteriza a mulher vagínica pela constante negativa da relação sexual, diz ainda que em alguns casos essas mulheres fantasiam que o falo é muito grande e que ao penetrá-las podem causar muita dor, sofrimento físico, lesões e até dilacerações, e que normalmente se envolvem com homens inseguros, atenciosos, que respeitam seus limites.
- Tratamento
Assim como Araujo, Masters & Johnson ressaltam a importância de um tratamento bem direcionado, a importância de uma avaliação médica completa, que determina a presença ou não de anormalidades como possíveis causadoras dos espasmos involuntários, levando-se em conta também questões psicológicas que segundo vários teóricos são comuns em casos de vaginismo, como vimos nas etiologias possíveis.
Para Kaplan o tratamento do vaginismo tem como objetivo principal a modificação da causa imediata da disfunção, sendo essa a resposta condicionada de contração do canal vaginal. E, assim como outros autores, indica o tratamento de questões físicas que possam existir, em seguida o tratamento pode ser administrado da seguinte forma, primeiro a terapeuta indica o tratamento da atitude fóbica da paciente, e indica também a dessensibilização com sondas graduadas, alem de tratamento psicanalítico para tornar conscientes conflitos inconscientes geradores de ansiedade e tratamento medicamentoso auxiliando o processo terapêutico. Segundo a autora, é importante que a paciente respeite seus limites e realize todos os exercícios exatamente como orientado pelo terapeuta.
Em muitos casos o vaginismo demora a ser tratado, por questões culturais, de vergonha, e mitos que possam porventura residir no imaginário da paciente, porém quando não tratado traz problemas no âmbito conjugal, ocorrendo forte pressão sobre a mulher para que ocorra a relação sexual com penetração, e dessa forma muitas se submetem a métodos cirúrgicos de alargamento do canal vaginal, procedimento que na maioria dos casos não soluciona o problema e pode até agravá-lo.
Por fim Leiblum, Pervin & Campbell relatam que ao término do processo, quando as pacientes conseguem livrar-se de suas ansiedades, se afirmam como mulher adulta, ocorrendo o alívio dos sentimentos constrangedores que sentiam antes, e sentindo-se livres para decidirem sobre seu corpo e maternidade. Chama atenção e é relativamente comum o fato de que em alguns casos quando ocorre a melhora da paciente seu marido apresenta algum tipo de disfunção, seja porque esta já existia e não era percebida por conta do numero pequeno ou inexistente de relações sexuais entre o casal, ou até mesmo pelo esforço e dedicação empregados no tratamento da esposa.
Referências Bibliográficas
- ARAUJO, M. L. M. Um Estudo Sobre Vaginismo. Resumos da 2ª Mostra de Terapia Cognitivo-Comportamental, UERJ, 2004. Disponível em: <http://www.sbtc.org.br/documentacoes/eventos_anais/9_evand.pdf> Acessado em: 03.02.2009.
- LEIBLUM, S.R. Princípios e Práticas de Terapia Sexual. Ed. Jorge Zahar, 1980
- MASTERS, W. H. & JOHNSON, V. E. A Incompetência Sexual. Ed. Brasileira, 1970.
- MASTERS, W. H. & JOHNSON, V. E. A Resposta Sexual Humana. Ed. Roca, 1984.
- MASTERS, W. H. & JOHNSON, V. E. Heterossexualidade. Ed. Bertrand Brasil, 1997.
- TEXEIRA, A. C. P. Resposta Sexual Feminina. Apresentação em Power Point, 2008.
- TEXEIRA, I. Principais Disfunções Sexuais. Apresentação em Power Point, 2009.
- KAPLAN, H. S. A Nova Terapia do Sexo. Ed. Nova Fronteira, 1974
- KINSEY, A. C.; MARTIN, C. E.; POMEROY, W. B. & GEBHARD, P. H. Conduta Sexual da Mulher. Ed. Livraria Atheneu S.A., 1953.